Além do mais, cabe ressaltar que num Estado Democrático de Direito, mesmo existindo uma posição de supremacia do Estado em relação ao particular, a atuação da Administração Pública deve sujeitar-se aos parâmetros legais, não pode agir de forma abusiva, arbitrária ou desrespeitosa para com o cidadão, sob pena de ser responsabilizado civilmente e com isso causar prejuízo ao interesse público. Por tal razão, os entes administrativos têm sua conduta limitada e fiscalizada através dos sistemas de controle estabelecidos na Carta Magna, existem regras limitativas ao exercício do agente público quando no desempenho da função pública, instituídas no desiderato de garantir o respeito aos direitos individuais do cidadão.
a) Noções Gerais
No mundo jurídico a responsabilidade pode originar- se de duas situações distintas, quais sejam: poderá nascer da realização de um contrato, recebendo o nome de responsabilidade contratual, que decorre de atos bilaterais e estão reguladas na Lei 8.666/93; e também de atos unilaterais, que receberão o nome de responsabilidade extracontratual do Estado, justamente por não estarem atreladas a celebração de um contrato, ou seja, quando o Estado, e aqui entenda agente público, praticar um ato que venha a causar danos a terceiros poderá gerar uma responsabilidade civil para o Estado, conceituação esta que causa discussão doutrinária, alguns entendem ser a responsabilidade civil da Administração Pública, o que independente da conceituação engloba as responsabilidades em Privada e Pública.
O saudoso professor Hely Lopes Meirelles[2], assim explica: “Preferimos a designação responsabilidade civil da Administração Pública ao invés da tradicional responsabilidade civil do Estado, porque, em regra, essa responsabilidade surge de atos da Administração, e não de atos do Estado como entidade política. Os atos políticos, em princípio, não geram responsabilidade civil...Mas próprio, portanto, é falar-se em responsabilidade da Administração Pública do que em responsabilidade do Estado, uma vez que é da atividade administrativa dos órgãos públicos, e não dos atos de governo, que emerge a obrigação de indenizar”.
As espécies de responsabilidade em consonância com a natureza e a importância dos valores lesados pelo comportamento, podem ser: — a responsabilidade criminal ou penal, consequência da prática de um crime, uma conduta muito grave, por pôr em causa valores decisivos da vida em sociedade; — a responsabilidade administrativa, resultante de um ilícito desta natureza; — a responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, decorrente de um prejuízo causado a alguém.
Segundo leciona o professor Celso Antônio Bandeira de Mello[3]: “entende-se por responsabilidade patrimonial extracontratual do Estado a obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos”
Por ser de difícil constatação do ato que causava o dano, se de império ou gestão, tornava-se extremamente imprecisa esta teoria, sendo ultrapassada pela teoria da responsabilidade subjetiva.
A teoria da responsabilidade subjetiva coloca o Estado em posição de igualdade com o administrado, para fins de surgimento da obrigação de indenizar, se o particular somente pode ser responsabilizado quando atua de forma dolosa ou culposa, tratamento igual deve ser dado ao Estado. O ente público somente responde por atos de seus agentes quando estes atuam com dolo, intenção de causar o dano; ou culpa, quando dão causa por imprudência, imperícia ou negligência.
A teoria da culpa administrativa, primeira fase de transição entre a doutrina subjetiva e a atual responsabilidade objetiva, leva em conta, para o efeito da responsabilidade civil do Estado, a inexistência do serviço público, o seu mau funcionamento ou a sua ação retardada. Abandona-se a visão individualista da culpa, se dolosa ou culposa de certo agente público. Atualmente possui aplicação nos casos de danos decorrentes de caso fortuito ou força maior quando, aliado a evento extraordinário e imprevisível e de força irresistível, ocorre a falta do serviço em qualquer das modalidades.
A teoria objetiva possui duas vertentes: do risco administrativo - considera-se o Estado responsável pela conduta do agente público, a partir da coexistência de três elementos: ato comissivo do agente, mesmo agindo sem dolo ou culpa; dano a terceiro; e nexo causal, ou seja, exige-se que o dano tenha sido causado pelo ato comissivo do agente público. Ao Estado pois, incumbe, em compensação, indenizar os prejuízos ocasionados pela sua atividade, uma vez estabelecido o nexo causal entre o fato e o evento danoso, independentemente da consideração de haverem os agentes públicos procedidos com dolo ou culpa, só se devendo ter em vista a ocorrência de culpa ou dolo no comportamento da vítima. Segunda vertente da teoria objetiva: o sistema de risco integral - o Estado é sempre responsável pela reparação do dano, desde que entre este e o fato haja relação de causa e efeito, não importando que tenha havido ou não culpa ou dolo por parte da vítima ou dos agentes da administração. Mesmo possuindo iguais elementos do risco administrativo - ato comissivo do agente, agindo sem dolo ou culpa; dano a terceiro; e nexo causal – uma diferença se faz presente nesta teoria, qual seja, não há qualquer previsão de exclusão ou redução da responsabilidade do Estado, como ocorre com o risco administrativo.
No Brasil a Constituição Imperial de 1824 tratava o tema da responsabilidade de maneira diferente, seguiu a teoria da irresponsabilidade do Estado, porém, eram os funcionários públicos responsáveis de forma direta e exclusiva por prejuízos decorrentes de omissão ou abuso no exercício de suas funções. Assim determinava:
“Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade alguma”.
“Art. 179...
29 – Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício das suas funções, e por não fazerem efetivamente responsáveis aos infratores".
Era o que também previa a Constituição Federal de 1891:
“Art. 82 – Os funcionários públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões em que incorrerem no exercício de seus cargos, assim como pela indulgência ou negligência em não responsabilizarem efetivamente os seus subalternos".
Numa leitura apurada dos artigos citados, observa-se que imperava à época a irresponsabilidade do Estado por atos praticados por seus servidores perante o particular, estes deveriam ser responsabilizados pessoalmente.
Foi nesse regime constitucional que o Código Civil de 1916 (revogado), dispôs sobra a matéria em seu art.15 da seguinte forma:
“Art. 15. As pessoas jurídicas de direito publico são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrario ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano”.
A Constituição Federal de 1934 em seu art. 171, bem como a Constituição de 1937, fixou o princípio da responsabilidade solidária com o litisconsorte necessário, que foi mantida pela constituição de 1937, verbis:
"Art. 171 – Os funcionários públicos são responsáveis solidariamente com a Fazenda nacional, estadual ou municipal, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus cargos.
§ 1º - Na ação proposta contra a Fazenda pública, e fundada em lesão praticada por funcionário, este será sempre citado como litisconsorte.
§ 2º - Executada a sentença contra a Fazenda, esta promoverá execução contra o funcionário público".
Constituição Federal de 1946:
"Art. 194 – As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.
Parágrafo único – Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes".
Constituição Federal de 1967, também com previsão no art. 107 da Constituição de 1969:
“Art. 105 – As pessoas jurídicas de direito público respondem pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.
Parágrafo único – Caberá ação regressiva contra o funcionário responsável, nos caso de culpa ou dolo".
O Douto professor Hely Lopes Meirelles[4], assim preleciona: "Responsabilidade civil é a que se traduz na obrigação de reparar danos patrimoniais, e se exaure com a indenização. Como obrigação meramente patrimonial, a responsabilidade civil independe da criminal e da administrativa, com as quais pode coexistir, sem, todavia, se confundir. Responsabilidade Civil da Administração é, pois, a que impõe à Fazenda, Pública a obrigação de compor o dano causado a terceiros, por agentes públicos, no desempenho de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las. É distinta da responsabilidade contratual e da legal".
A atual Constituição Federal, no seu art. 37, § 6°, assim dispõe:
"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos dolo ou culpa”.
Os artigos 186 e 187 do atual Código Civil (lei 10.406/02):
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
Uma leitura atenta do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, ao contrário do dispunha o anterior, consagra a teoria da responsabilidade objetiva, assim vejamos:
“Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".
a) não se aplica à responsabilidade contratual, a qual está regulada pela lei 8.666/93 – Lei de Normas Gerais Sobre Licitações e Contratos da Administração Pública;
b) Exige-se para a configuração da responsabilidade do Estado três condições: um ato comissivo do agente público, no desempenho da função; o dano sofrido pelo administrado; e o nexo causal entre ato e dano;
c) A responsabilidade Estatal independe de dolo ou culpa do agente, pode surgir até mesmo de um ato ilícito;
d) A responsabilidade do ente consiste na obrigação de indenizar, é sempre de natureza patrimonial;
e) A condição de agente público é indispensável para a configuração da obrigação de indenizar do Estado;
f) A responsabilidade objetiva das concessionárias e permissionárias de serviço público alcança somente os usuários do serviço;
g) A responsabilidade do agente público é subjetiva, ocorrendo apenas no caso de dolo ou culpa;
i) Para que o Estado exerça seu direito de ressarcimento em face do agente público, há necessidade que: a) seja comprovado dolo ou culpa do agente; b) a sentença condenatória de indenização tenha seu trâmite transitado em julgado; c) Pagamento da indenização pelo agente.
Não há formulado um conceito único sobre o que seja caso fortuito e força maior. Seguindo a maioria da doutrina, caso fortuito são atos humanos praticados por terceiros, extraordinários, imprevisíveis e irresistíveis. Força maior é um evento da natureza, imprevisível, irresistível.
Por ser o Caso fortuito e a Força maior um acontecimento externo, excluem o nexo causal nas situações típicas de responsabilidade do Estado. Forçoso então concluir, que não há responsabilidade objetiva nos casos de danos decorrentes de força maior (raio, incêndio, inundação, vendaval) ou oriundos de casos fortuitos, a exemplo dos atos multitudinários, da greve e da grave perturbação da ordem, dado que o Estado e as demais pessoas prestadoras de serviços públicos não os causaram. Por esses danos podem responder subjetivamente, isto é, nos termos da teoria da culpa administrativa que pressupõe a falta do serviço. Ainda, não respondem, quer objetiva, quer subjetivamente, pelos furtos, acidentes de trânsito, porque o semáforo enguiçou, e outros, dado que decorrentes do risco comum que os administrados assumem por viverem em sociedade, salvo no caso de furto se praticado por assaltante foragido de uma penitenciária.
É necessário, segundo a jurisprudência, a comprovação da culpa da Administração, em atos depredatórios de terceiros (caso fortuito) e por fenômenos naturais que causem danos aos particulares (força maior). Não se provando a culpa da Administração, nesses casos, não há que se falar em indenização.
f.1. Responsabilidade por Danos Nucleares
Prevista na alínea d, inciso XXIII do art. 21 da Constituição Federal nos seguintes termos: “a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa”.
Observa-se pelo dispositivo constitucional que o particular não atua na prestação de serviço público, mas, estará sujeito a responsabilidade objetiva por danos nucleares causados.
Sendo assim, está é a única possibilidade de responsabilidade objetiva sem prestação de serviço público.
Uma obra pública deriva sempre de um ato administrativo de quem ordena sua execução. Nesta situação, a responsabilidade poderá ser do Estado ou não, o que irá determinar será a maneira como ocorreu o dano, se ocorrer pelo simples fato da obra, ou seja, pela própria natureza da obra, tais como, localização, extensão, duração, a responsabilidade será objetiva. Mesmo que a obra pública seja confiada a empreiteiros particulares, a responsabilidade pelos danos oriundos do só fato da obra é sempre do Poder Público que determinou sua realização, alcançando até as lesões a terceiros ocasionadas pela obra em si mesma. Assim, a Administração Pública que a planejou responde objetivamente, sem indagação de culpa de sua parte.
A má execução da obra também poderá gerar uma responsabilidade, ocorre que neste caso ela é subjetiva, isto é, depende de dolo ou culpa, e por ter natureza contratual, em um primeiro momento não se aplica ao Estado, mas ao executor da obra.
A regra é a não responsabilidade do Estado pelos atos praticados pelo magistrado no exercício de função típica, de julgar. A Constituição Federal traz apenas uma exceção, in verbis: “O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”
Ficará, entretanto, o juiz individual e civilmente responsável por dolo, fraude, recusa, omissão ou retardamento, conforme prescreve o art. 133 do CPC:
"Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz, quando:
I - no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;
II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte.
Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no no II só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não Ihe atender o pedido dentro de 10 (dez) dias".
Forçoso concluir, que o dispositivo alcança apenas as condutas dolosas do magistrado, as culposas são insuscetíveis de responsabilidade, seja do magistrado ou do Estado.
Sendo assim, o ressarcimento do que foi pago pelo Poder Público deverá ser cobrado em ação regressiva contra o magistrado culpado. Quanto aos atos administrativos praticados por órgãos do Poder Judiciário, equiparam-se aos demais atos da Administração e, se lesivos, empenham a responsabilidade civil objetiva da Fazenda Pública.
[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Responsabilidade
[2] Direito Administrativo Brasileiro, 33ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 649
[3] Curso de Direito Administrativo, 17ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 876.
[4] Ob. Cit. p. 649
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DE MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 17ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 95
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 20ª Ed. São Paulo: Atlas, 2007.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 33ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo, 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado, 15ª Ed. Niterói, RJ: Impetus, 2008.
FEDERAL, Constituição.
CIVIL, Código.
SITES VISITADOS
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http://www.presidenciadarepublica.gov.br
http://www.wikipedia.org